Dobram registros de superbactérias em hospitais de Porto Alegre

 

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Contínua, a luta contra os germes megarressistentes está longe de ser vencida — inclusive no Rio Grande do Sul. Em Porto Alegre, dobrou do ano passado para cá o número de casos diagnosticados de infecção hospitalar pelas duas mais agressivas superbactérias, a KPC e a NDM-1. Elas atacam sobretudo pacientes debilitados e internados em Unidades de Tratamento Intensivo (UTI).

Em 2012 foram 77 casos de infecção causada pela KPC (Klebsiella Pneumoniae Carbapenemase) detectados em UTIs e 1 caso de NDM-1 (New Delhi metallo-beta-lactamase), um germe agressivo oriundo da Índia e que representa novidade no Brasil. Já em 2013, apenas de janeiro a outubro, foram 146 pacientes atacados por infecções hospitalares de KPC e 14 de NDM-1.

No Rio Grande do Sul, os números apresentam um quadro um pouco melhor. Foram 422 casos de infecção hospitalar relatados no ano passado e 408 até outubro deste ano, o que indica situação estável. A contabilidade inclui todos tipos de infecção, mas a KPC é a bactéria predominante.

Olhados de forma isolada, os números não são expressivos. Como o número de leitos de UTIs no Estado é 2.222 e um paciente ocupa, em média, 15 dias cada leito, é razoável supor que por ano passem pelas UTIs 54 mil doentes. Ou seja, a infecção hospitalar parece ter atingido apenas um em cada 130 doentes, aproximadamente. Menos de 1%, se os números espelhassem a realidade.

Até poderia ser, se os hospitais informassem corretamente sobre a presença de bactérias resistentes a antibióticos. Mas a realidade é outra: muitas UTIs simplesmente não informam detalhadamente casos de infecção.

Uma das explicações para o número de casos relatados de infecção ter subido em Porto Alegre pode ser, paradoxalmente, que os hospitais começaram a fazer relatos mais precisos. Ou seja, tanto a infecção pode ter aumentado como outro fenômeno ter ocorrido: mais rigor nas notificações.

O certo é que as infecções por superbactérias (nome que os médicos detestam, mas pelo qual elas são popularmente conhecidas) são uma constante preocupação das autoridades sanitárias. Não é para menos.

Elas são micro-organismos que, por mutação genética, adquiriram mecanismos de resistência a antibióticos. Isso eleva o custo de tratamento: os antibióticos disponíveis são caros e custam cerca de R$ 1,4 mil ao dia. Entre os que desenvolvem infecção hospitalar nas UTIs, a mortalidade chega a até 50%, na maioria dos hospitais. Um número bastante negativo, mas que não chega a espantar especialistas.

— É que as pessoas que contraem a infecção já estão muito debilitadas e já chegaram ao hospital com risco de vida, tanto que estão em UTIs. Aqui, a média de idade dos que estão internados é 82 anos. São pessoas entubadas, com sondas, hemodiálise e ventilação mecânica, conexões que oferecem risco de infecção. Mas, sem esses equipamentos, os pacientes não sobrevivem. É um dilema — comenta o infectologista Fernando Ramos, chefe da comissão anti-infecção hospitalar do Hospital São Lucas da PUC, de Porto Alegre.

Na UTI Geral do São Lucas, seis dos 15 leitos estão ocupados por pacientes com infecção hospitalar, conforme Ramos. Um deles é um transplantado de rim, cuja filha está inconformada.

Ela disse a Zero Hora que o pai, com imunidade baixíssima para que o corpo não rejeitasse o transplante, foi colocado num lugar próximo a um paciente contaminado e acabou infectado com a KPC. O médico Fernando Ramos assegura que o procedimento-padrão é o contrário: pacientes infectados são colocados junto a outros infectados, para evitar que os sadios sejam contaminados. No caso da UTI Geral, foram concentrados ali.

Superlotação e demora por leito

Presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers), o cirurgião Fernando Weber Matos atribui a dois fatores o aumento nas notificações de infecção hospitalar: a superlotação dos hospitais e, em consequência, a grande espera dos pacientes por um leito.

— O doente demora a conseguir um quarto no hospital. Aí chega muito debilitado e adquire infecção hospitalar, esse é o quadro geral, especialmente de pacientes crônicos, já fracos. O RS perdeu 10 mil leitos hospitalares nas últimas décadas. A saída é aumentar a disponibilidade de atendimento e reduzir a espera. Não adianta só combater a bactéria — critica.

Fonte: Jornal Zero Hora RS